Aquarela de poesias

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Poesias para você

segunda-feira, 29 de junho de 2015

CRÔNICA À PARTEIRA: D. Carolina Fachinello

                   CRÔNICA À PARTEIRA
         ( vó Carolina-homenagem póstuma )

 D.Carolina era uma benfeitora no interior de Santa Catarina, nas, então, pequenas cidades de Ouro Verde e Abelardo Luz, entre outras. Há tempos idos era preciso lavar a roupa longe da casa, deixar quarar ao sol, recolher e voltar. As funções domésticas incluíam matar o porco, vender os ovos, cozinhar no fogão à lenha, alimentar os cães, cuidar dos filhos da comadre, em alguma emergência. 
E vovó Carolina cuidava da loja de secos e molhados que era responsável pelo sustento da família .E servia refeições aos caminhoneiros que vinham em busca de sua culinária, simples ,mas impecável. Cuidava do marido, de seus quatro filhos e de uma filha de criação que uma freira do hospital lhe colocara nas mãos.
Mesmo com tantas ocupações,em certa ocasião, foi chamada,às pressas, para auxiliar um médico em trabalho de parto de uma paciente. Vó Carolina se dirigiu para o local, ajudou em tudo e prestou atenção aos procedimentos feitos. Ao ver a criança apontar a cabecinha e ao ouvir o choro habitual, ficou emocionada ao colocar suas mãos para sustentar a criança.
Depois dessa data não parou mais .Nesse instante ela se impôs uma missão humanitária e sem preço.
Saía de sua casa de carroça, enfrentava o mau tempo, o frio das noites, os tropeços da carroça que transitava entre as pedras e a estrada de chão batido a desafiar o cavalo.
Não recusava seu auxílio a nenhuma pessoa.
Certa ocasião, depois de enfrentar uma estrada íngreme e cheia de curvas, chegou à casa de uma mulher que gritava e se contorcia de dor. Era o seu primeiro filho. Vó Carolina viu que algo estava errado, ao tocar na mulher. Tratou de avisar o marido e disse que faria o possível para finalizar o trabalho de parto com sucesso.
A mulher estava exausta de fazer tanta força. D.Carolina pediu-lhe que tentasse mais uma vez. E  que  com decisão e firmeza e buscasse as últimas forças dentro de si.
A mulher desmaiou e o bebê foi expelido na mesma hora. A criança estava roxa e com várias voltas de cordão umbilical ao redor do pescoço. Vó Carolina tentou de todas as maneiras reanimar o bebê. Mas, subitamente, nada mais era possível fazer. A criança deu um pálido suspiro, revirou os olhos e faleceu.
Minha sogra chorou copiosamente, bem mais do que a mãe da criança que estava, ainda, fora de si. Nunca havia perdido nenhuma criança no parto.
Mas ,em seguida, lembrou da mãe da criança e foi tratar de acordá-la e dar-lhe uma medicação para pressão baixa. A parturiente estava muito fraca e só queria voltar a dormir.
D.Carolina voltou a olhar para o bebê. Ao tocar em seu corpo inanimado voltou a chorar, com todo o sentimento de uma boa  e dedicada mulher, quase analfabeta. Mas, mesmo assim, consciente de seu trabalho de parteira que a colocou nessa missão de trazer novas vidas às famílias daquele interior agreste.
Voltou, aos poucos, à realidade.  E percebeu, nesse instante, que apesar de ter feito uns 1000 partos, com sucesso, e de se alegrar com cada criança nascida, nada apagaria a dor que lhe invadiu ao ver uma criança não nascida.
Na manhã seguinte, ao levantar, ainda sofrida, leu um bilhete que havia sido colocado sobre sua mesa de café. As mal traçadas linhas pediam que fosse atender outra parturiente, num local distante e árido. 
Sem raciocinar, bebeu uma taça de café preto, ajeitou sua mala, ajoelhou-se diante da estátua da Virgem Maria e fez uma prece.
Saiu, fechando a porta da casa, sem saber quando retornaria.

                                     KATIA CHIAPPINI


                           e-mail:katia_fachinello42@hotmail.com

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