MINHA NETA E OS DÓLARES !

                           OS DÓLARES

Minha mãe deixou comigo alguns dólares que tinha guardado  : os que haviam sobrado de suas viagens. E permanecem guardados por mais de quarenta anos. Estão guardados num pequeno baú com cadeado, sobre a cômoda do quarto.
Mas um fato inusitado chamou minha atenção, numa certa manhã de domingo.
Minha netinha queria procurar  colares, brincos e pulseiras entre meus pertences.
Coloquei algumas caixas sobre minha cama e, entre elas, o baú contendo algumas bijuterias e tendo ao fundo um envelope pardo.
Minha neta vasculhou tudo e , em dado momento, se deparou com o envelope que abriu, imediatamente. Era uma importância pequena mas bastou para aguçar o imaginário infantil. Contou todos eles e escreveu os valores em uma etiqueta, recolocando-os no mesmo lugar, separando as quantias por espécie e prendendo-as com elástico. 
Então começou a percorrer o apartamento, certamente invocando os contos infanto-juvenis, com duendes ,fadas e esconderijos secretos. Estava obcecada em ocultar os dólares num local de difícil acesso. Queria que eu mandasse fazer fundos falsos em ventiladores de teto, armários, estantes, de modo que não pudessem ser encontrados tão facilmente. Percebendo que seu empenho não encontrou eco em mim, depois de um certo tempo, desistiu de quebrar a cabeça. Então fez questão de me mostrar que não haviam dólares nos bolsos de sua bermuda .Como eu me negasse a revistá-la falou :
- Vovó, você não desconfia das pessoas ? 
Como eu disse que confiava nos frequentadores de minha casa, continuou :
- Se fosse eu revistaria.
-Não, minha neta, como desconfiar de você ?
- Mas tem que desconfiar, vovó.
- Bem, se eu achar um esconderijo fantástico, eu digo pra você.
E assim deixando minha neta com suas conjecturas fui tratar de fazer o almoço. Quando me virei lá estava ela grudadinha em mim :
- Vovó, se juntar mais dólares,você pode me ajudar numa viagem à Disney ?
- Sim, se for sempre estudiosa e bem comportada e se não se revoltar contra seus pais e atender às suas ordens Ou, pelo menos, questioná-las sem grosserias nem palavras ofensivas.
- Vovó, só eu e você estamos sabendo desse segredo. Conto com você, viu ?
Olhei para ela sorrindo e achando tudo isso muito curioso.
Logo chegou minha filha para buscá-la e despedi-me delas com um beijo Fiquei pensando em minha neta de apenas 12 anos e tão entusiasmada por uns poucos dólares que encontrou.
Primeiro se assustou com a visão das notas verdes, depois idealizou uma viagem e finalmente quis que eu os guardasse em segredo, em lugar apropriado, para que não se perdessem. Fiquei lembrando do brilho dos seus olhos, de uma certa excitação, de seu entusiasmo contando as notas e do sentimento de cumplicidade  nesse ''segredo'' que queria manter comigo. 
Quando fui me deitar e fazer minhas orações, ouvi o telefone tocar : 
- Vovó, troque algumas notas mais amassadas que separei sem etiqueta,e, principalmente uma delas, colada com fita adesiva.
Segui seu conselho. Percebi que o doleiro da casa de câmbio ficou olhando demoradamente para as notas e para mim.
Então arrisquei :
- Se você não quiser trocar tenho quem queira.
O doleiro aceitou as notas, sorrindo meio sem graça, e me deu o valor correspondente em reais.
Saí direto para depositá-los no banco : apenas alguns reais,  acrescidos aos demais, numa sofrida conta de uma professora estadual aposentada.

                                  KATIA CHIAPPINI
                Email :katia_fachinello42@hotmail.com