Aquarela de poesias

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Poesias para você

terça-feira, 12 de fevereiro de 2019

CASA VAZIA

                        CASA  VAZIA

A vida é mesmo um carrossel gigante que rodopia e mostra suas inúmeras faces.
A casa da praia recebe muitas pessoas entre janeiro e fevereiro.
Os netos menores encantam pela alegria que lhes é pertinente.
Os netos maiores encantam por se posicionarem na vida em busca de uma carreira universitária que, no momento, é a prioridade.
A casa reúne grandes e pequenos. Visitantes e animais de estimação, percorrem o ambiente num desenrolar de atividades constantes.
Há uma energia que não deixa o fluxo parar.  E uma vontade de percorrer as belezas naturais do local, em longas caminhadas. 
Há o mar que recebe com suas águas murmurantes. Há uma imensidão de rochas e penhascos que a ninguém deixa indiferente.
Cada qual faz o seu roteiro e aproveita o dia como melhor lhe aprouver.
Cada um ajuda de alguma forma para que a rotina da casa tenha uma certa disciplina.
Duas redes na sacada recebem os leitores ou ouvintes de boa música ,que nela se deixam espreguiçar. Nas noites de alta temperatura, há candidatos que escolhem a rede para dormir.
A noite convida a caminhar na orla marítima, onde bancos, estrategicamente colocados, nas calçadas, recebem os apreciadores das noites de lua cheia. E as partidas de futebol ocupam a areia.
O churrasco segue um ritual interessante porque os homens tomam a iniciativa e se responsabilizam pelo preparo. 
A música ambiental toma conta dos presentes e, enquanto todos esperam, é possível beber uma ''caipirinha'' e beliscar as guloseimas que chegam sobre a mesa central.
A casa cheia fica impregnada de boas lembranças de outros veraneios que são lembrados pelos presentes.
Muitas histórias se desenrolam entre sorrisos. E o bom humor é peculiar às férias de verão. 
Mas chega o dia de retornar à cidade.
Quebra-se o encanto, repentinamente.
A turma se despede com beijos e abraços e com a promessa de retornar na próxima temporada de férias.
A casa vazia começa a incomodar a mim, pois permaneço para deixar o ambiente em condições, onde tudo deve ser colocado limpo e bem guardado, nos respectivos lugares.
Desço para ajudar a carregar as malas até o carro e já sinto a diferença do clima, agora mais pesado, pois todos ainda gostariam de alongar a estada na praia de mar.
Mas é preciso voltar para organizar a vida na cidade, onde o início das aulas e demais compromissos aguardam providências.
As férias são encurtadas em vista desses mesmos compromissos.
Permaneço olhando meus entes queridos tomando seus lugares no carro e já saudosa da folia de verão.
Quando retorno ao apartamento sinto aquele aperto que o vazio deixa.
Levo um tempo para me reerguer.
Vou escutar os bolivianos e peruanos tocarem suas flautas de mágica sonoridade. Compro um novo CD, a cada ano.
Porém, casa vazia, é preciso raciocinar, é apenas vazia aparentemente.
Pois continuamos a sentir a presença dos entes queridos, ao circularmos pelas dependências da casa. E lembramos, a todo momento, das brincadeiras infantis, das histórias que relatamos em grupo, dos jogos de canastra ou xadrez que costumam se desenrolar nas tardes chuvosas.
Lembramos também de escrever um texto e confidenciar a ele nossos pensamentos e sentimentos.
Lembramos de ir ao restaurante novo que abriu e que não conseguimos frequentar, por falta de tempo. E de beber aquela cerveja com uma tranquilidade inenarrável.
 Lembramos de adquirir um livro para deitar na rede e estender o corpo, confortavelmente, para nos embrenhar na história, sem sermos interrompidos.
Lembramos um pouco mais de nós mesmos e de preservar a individualidade como um direito que nunca cessa.
Lembramos  de levar uma cadeira, ao entardecer, para a beira do mar. E, nesse instante, nos será dada a visão do esplêndido e diário anoitecer, acontecendo diante de nossos olhos. 
A casa vazia vai ficando menos vazia porque descobrimos novas maneiras de não torná-la tão solitária.
É possível convidar uma amiga para fazer um lanche na sacada ou para beber uma cuia de chimarrão. Ou para conversar, à vontade.  Depois, é possível estender a tarde numa sorveteria. 
Na praça central há a movimentação dos camelôs a distrair os transeuntes.´Palhaços e malabaristas se apresentam para o público, onde  shows promovidos pela prefeitura ocupam o palco da praça e onde crepes e pipocas são feitos na hora, para deleite das crianças.
Voltamos a nos recolher e a sensação de paz vem se aproximando.
A casa, cheia ou vazia, não perde seu clima de aconchego.
Sou e quero ser uma casa cheia. Cheia de bons sentimentos pelos meus queridos familiares e amigos, que se dedicam a me dar o apoio do qual necessito nas horas mais difíceis, que advém de circunstâncias  e imprevistos que se apresentam frente a frente.
O vazio virá  só se o convidarmos para conviver conosco, para se tornar nosso par constante.
E a praia de mar, panorama que se vislumbra da casa, se define bem mais como uma casa cheia do que como uma casa vazia.
E a casa da praia existe desde os tempos de infância, quando eu veraneava com meus pais e irmão. E já alcança a terceira geração, com o mesmo sentimento de companheirismo e igual envolvimento entre os entes queridos. 
Então, eu falei casa vazia ?
Não, leitores, apenas uma casa menos cheia, às vezes ,mas sempre um lar acolhedor.
Uma casa sem discórdia, sem animosidade e sem desamor.
Uma casa para chamar de minha, nossa e vossa.
E que siga sendo a base material do vínculo familiar e a base espiritual que permite acolher ascendentes e descendentes, num clima de união que se fortalece cada vez mais.

KATIA CHIAPPINI


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