PAPAI, O QUE VOCÊ DIRIA?

PAPAI, O QUE VOCÊ DIRIA?

O que você diria se eu lhe dissesse que foi um exemplo de dedicação à família? Se soubesse que apreciei seus conselhos sempre que os solicitei? Se eu lhe lembrasse que seus ensinamentos foram preciosos, antes de eu embarcar para a lua de mel?

Se eu falasse que dei muito valor ao fato do senhor economizar com determinação para me presentear com um piano importado de excelente qualidade?

Se eu lhe contasse que fiquei muito feliz quando comprou a coleção de Monteiro Lobato  para me presentear? E num outro momento, sem igual, quando recebi de presente a obra intitulada ''A Divina Comédia de Balzac?

O que você me diria se eu falasse que me lembro bem do dia em que choramos juntos ao ouvir, na velha vitrola, a ''Ave Maria'' de Gounod?

O que me diria, papai, se eu lhe dissesse que fiquei rindo de sua paciência, quando acatou a sugestão de mamãe, pegou um banquinho e foi fumar na frente da casa?

E que percebia que você evitava discutir com mamãe, por detalhes?

E se, por outro lado, eu não concordasse com você quando não permitiu que eu fosse pousar no sítio de minha melhor amiga, só por uma noite?

Papai, se eu lhe dissesse que estranhei o fato de ter sido convidada para ir ao seu escritório, não para ir ao cinema, ou restaurante, e sim para me pedir que evitasse discutir com mamãe? E quando reclamei que estava decepcionada, qual não foi minha surpresa quando você me retrucou dizendo: 

- Filha, cada vez que você discute com a mãe, eu é que não durmo de noite. E quando lhe solicitei uma explicação, você disse que ela insistia em contar os detalhes da discussão para você. E que se ficasse quieto ela ficava furiosa e, aí mesmo é que a argumentação se estendia além do esperado e aquele blá ,blá, blá, sem fim, lhe deixava zonzo e desconfortável, a ponto de tirar sua tranquilidade para dormir. 

Mas, papai, continuando, o que diria se soubesse que tenho saudades das férias  em família, na praia de Torres?

E que tenho saudades dos jogos de tabuleiro, das histórias que me contava, do carteado, ao entardecer?

Papai, saiba que tenho saudades da mesa posta para receber os padrinhos e amigos na ceia de Natal, e da missa do galo que era rezada à meia noite.

Meu querido pai, o que você diria se soubesse que foi o personagem masculino mais importante de minha vida? Não precisa me dizer nada porque você sempre soube disso.

Permita-me confessar que tínhamos uma igualdade de almas e uma empatia perfeita. E que o seu olhar me bastava, antes mesmo de você proferir as palavras, para eu entender que algo lhe fizera ficar triste.

Boa noite, meu querido pai

Katia Chiappini