Aquarela de poesias

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Poesias para você

sexta-feira, 3 de novembro de 2017

MEU ALUNO!

                           MEU ALUNO!

Quando lecionei crianças do ensino fundamental, nos idos de 1970, aproximadamente, tive a satisfação de conviver com alunos respeitosos que demonstravam carinho pelos professores da Escola.
Percebi que um dos alunos de quarta série não queria frequentar as aulas de Educação Física e pedia para ficar na sala comigo, enquanto a turma descia para o pátio e eu aproveitava para corrigir cadernos, nesse intervalo.
Como o fato se repetia, descobri que esse aluno não queria tirar a camisa larga que usava e trocá-la por uma regata que seria adequada para praticar esportes e que fazia parte do uniforme para essas aulas. Como a professora insistisse na troca de roupa ele deixava o pátio e se retirava das aulas.
Falei com a minha colega e expliquei que, provavelmente, ele não queria que a turma percebesse que tinha seios definidos e diferentes dos demais alunos do sexo masculino.
Diante disso, a professora sugeriu que entregasse alguns trabalhos sobre temas de esporte, que seriam avaliados para recuperar a nota, desde que se comprometesse a não se ausentar mais das aulas.
E deixou que ele fizesse as aulas com a camisa que quisesse.
Nas demais disciplinas o aluno era comprometido e obtinha boas notas.
Tempos depois ele ficou sabendo de minha interferência e me agradeceu comovido. Deu-me um forte abraço e disse-me palavras carinhosas para demonstrar -me seu apreço.
Alguns anos depois encontre-o no supermercado,com trajes bem espalhafatosos, um cabelo comprido e cacheado, com o rosto bem maquiado, como se fosse uma figura feminina. Mas reconheci aquele sorriso e o par de olhos verdes e expressivos.
Ele falava alto porque ficou feliz ao me reconhecer. Entregou-me o cartão do seu salão de beleza e, com certa euforia, me abraçou e deu os dois beijinhos no rosto, eufórico e quase saltitante.
Perguntei-lhe sobre a família, o trabalho, sobre os planos de vida e demonstrei minha satisfação em encontrá-lo, aparentemente bem, como bem se sente um ser produtivo que busca seu lugar ao sol.
E logo me veio a lembrança daquela criança pequena, na época do ensino fundamental, que tinha poucos amigos, que se mostrava inibida e triste. E que eu ajudei a convencer de que não poderia faltar às aulas de Educação Física.
Minhas suspeitas haviam se confirmado.
Mas o fato é que na infância esse aluno quase não se comunicava com o mundo a sua volta.
E, agora adulto, me parecia mais tranquilo e comunicativo em sociedade.
Era dono de um estabelecimento, tinha outros funcionários e uma clientela fiel que o deixava mais tranquilo.
E isso é o mais importante: encontrar a si mesmo e aceitar sua realidade.
E assumir sua diversidade, ou modo alternativo de viver.
Que sejas muito feliz meu querido aluno!

KATIA CHIAPPINI

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