Aquarela de poesias

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Poesias para você

segunda-feira, 10 de agosto de 2015

MATINÊ

                              MATINÊ



O termo matinê é originário do francês ( matinée ) que significa um encontro na hora matinal, onde as tardes reúnem as pessoas para assistir um sarau, um show. De modo geral é uma atividade social que reúne as pessoas na parte da tarde.
Quando eu era pré-adolescente costumava frequentar as matinês de Rivera, Uruguai. Eram sessões de cinema entre 14 e 20 horas. As programações eram diferentes a cada duas horas. Havia quem ficasse para assistir todos os filmes e outros que assistiam duas sessões e se retiravam. Mas o ingresso dava direito a permanecer em todas as sessões programadas à tarde.
Após as 20 horas a programação era feita para os adultos.
As matinês eram frequentadas por rapazes e moças jovens. Os grupos eram formados por colegas da escola, por amigos ou pelos pais e mães que levavam seus filhos. As sessões constavam de histórias românticas, chamadas de ''água com açúcar'', comédias ou bang-bang.
O lanterninha permanecia circulando pela sala, não só para levar os que chegavam com atraso, aos seus lugares, como para cuidar do ambiente e preservar o bom comportamento.
Era possível observar os casais de adolescentes de mãos dadas, ou o namorado envolvendo os ombros da namorada, ou um ''selinho'', sem que nada causasse constrangimento algum.
Certa ocasião presenciei uma cena em que um homem mais velho se acomodou ao lado de uma jovem e colocou sua mão sobre os joelhos dela .Imediatamente, a moça reagiu e deslocou sua bolsa sobre o rosto do homem e bateu nele repetidas vezes. O homem se levantou e saiu do cinema, na mesma hora, sem nada dizer.
Em todos os outros momentos, nas matinês de domingo, jamais presenciei algo semelhante.
Ao sair do cinema era possível parar na confeitaria e sentar nas mesas colocadas nas calçadas, onde a juventude se reunia.
Mas logo depois íamos para  nossas casas. Os pais nos davam limites em troca da permissão de sair para as matinês.
Hoje as matinês são de funk e estão se alastrando nas cidades grandes.
O funk nasceu com o propósito de ser a expressão da cultura afro-brasileira.
Quando ensaiou seus primeiros passos, o funk tinha a intenção de chamar atenção para a realidade da vida dos pobres de uma comunidade carente e do povo que habita as favelas.
As batidas das músicas e os lamentos dos cantores refletiam a problemática social e questionavam o abandono de uma parte da população que solicitava proteção para suas famílias e melhores condições de vida.
E o sofrimento do povo não era considerado pelos governantes e as letras falavam do insuficiente envolvimento do Estado nas comunidades carentes das favelas. 
Mas depois do ano 2000, a funk tomou outros rumos distintos.
A banalização do sexo e o incitamento à promiscuidade é o aspecto negativo dessa cultura.
As letras trazem em seu conteúdo  a aceitação do sexo explícito e pregam a degradação da mulher como objeto de prazer carnal.
Nas favelas o funk se torna , além das considerações de ordem moral, uma assunto de saúde pública. Em comunidades pobres, quase analfabeta, sem conscientização de planejamento familiar. proliferam a gravidez indesejada, o crescimento excessivo da população carente dos mínimos recursos para a sobrevivência e, como consequência e, o que é relevante nessa análise, se percebe a preocupação com o crescimento da favelização. 
No ''funk proibidão'' as letras são feitas por traficantes de drogas e tecem elogios ao assassinato dos membros de gangs rivais.
Devido à falta de regulamentação, no baile funk, há consumo de drogas pesadas e o ambiente se torna propenso á criminalidade.
As matinês de funk estão agregando a juventude de todas as classes sociais e levam multidões de jovens aos salões. E quero crer que os pais, muito atarefados  e displicentes, ou parte desse universo, não tomou conhecimento do que acontece nesses ambientes.
Não raro, os policiais, os que ainda interagem, colocam moços e moças nas viaturas e lavram ocorrências. Deixam os ''festeiros'' por 24 horas vagando pela delegacia. Depois, exigem a presença dos pais para liberar os filhos.
Ninguém é de ninguém parece ser a premissa dos bailes funk. Saudades dos doces famosos das confeitarias de Rivera, da Avenida Sarandi, onde nos reuníamos para prolongar o domingo das matinês.
Saudades das matinês de minha infância, na Estância São Miguel do Sarandi, onde meus primos e eu éramos recebidos pelos meus queridos tios, Léo e Bebê, durante as férias escolares.
Essas eram matinês dançantes, ao som da sanfona, que se abria em leque, nas tardes de domingo. A música era a do folclore gaúcho e a a dança trazia para os salões, as saias rodadas das prendas e a sua flor vermelha nos cabelos. 
E o galpão da estância era o local improvisado e enfeitado para as matinês da gauchada. 
Saudade do tempo onde os valores familiares davam oportunidade de uma convivência sadia, fundamental para a transformação de uma criança no homem do amanhã.

                                      KATIA CHIAPPINI



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