Aquarela de poesias

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Poesias para você

quinta-feira, 11 de julho de 2013

MAIS UM CAFEZINHO ?

                  - MAIS UM CAFEZINHO ?
                  - NÃO, OBRIGADA !

Lori é faceira, sensível, firme , excelente mãe e amiga.
É minha companheira para assistir peças de teatro e espetáculos musicais.No verão viaja até a praia com a família, como faço também.
Numa dessas ocasiões em que voltava da praia, trazia, além de malas de roupas, muitas sacolas de plástico em sua bagagem.
O carro veio lotado e Lori desceu na frente do edifício onde morava, em Porto Alegre, deixando os volumes na portaria, aos cuidados do porteiro. Voltou até o carro e se dirigiu à garagem onde estacionou o veículo. Chegando à portaria, novamente, disse :
- Vou subir com alguns volumes e retorno .
Antes disso, solicitou ao funcionário que jogasse no lixo algumas sacolas contendo  cascas de frutas, guardanapos de papéis servidos, garrafas vazias e jornais velhos.
E assim  descarregou os volumes no apartamento e veio buscar outros até que a bagagem toda chegasse ao seu destino.
 Preparou um bom café  com pão e manteiga e se alimentou.
Depois pensou em guardar primeiro os gêneros alimentícios e outras miudezas contidas nos sacos plásticos, antes de tomar seu banho e descansar.
Começou a remexer em seus pertences e não tardou a dar falta de uma sacola com pertences pessoais e de valor estimativo.
Desceu até a portaria e indagou do porteiro :
-  Onde colocaste o lixo que te pedi?
-  Dei ao carroceiro. 
-  Como ? não percebeste que uma das sacolas era mais pesada ?
-  Será  que fiz o que estou pensando, dona Lori ?
-  Sim, simplesmente entregaste ao carroceiro uma sacola com meus pertences
-  A senhora me desculpe.
Lori, nem se deteve a ouvir nada. Correu a tirar o carro da garagem para tentar encontrar o carroceiro nas imediações. Sabia que o ponto dos carroceiros era próximo ao Rio Guaíba. Mesmo ao perceber a aproximação da noite nenhum temor tomou conta dela.
Foi encontrando os carroceiros e perguntando, um a um, que percurso haviam feito. Explicou que precisava identificar sua sacola recolhida por acidente.
Os papeleiros ficaram assombrados com o fato de Lori estar com um automóvel de valor transitando por becos de frequência duvidosa. 
Um morador de rua se aproximou dela e disse :
- Madame, deixe seu carro numa garagem e depois venha  caminhando que lhe mostro os locais onde, provavelmente, poderá encontrar o local onde ficam os barracos dos carroceiros.
Assim, percorreram algumas ruelas e becos e não tardou que avistassem, através de uma janela aberta, algumas medalhas, troféus e fotos jogados no chão, dentro de um casebre. Ao vê-los Lori teve certeza de que eram seus pertences. Agradeceu ao homem, despediu-se dele e bateu na porta. Uma mulher jovem veio recebê-la. Lori revelou o motivo de sua presença ali e soube que seu marido trouxera , realmente, uma sacola com pertences não comuns e nada parecidos com sucata. Então Lori pediu as medalhas, troféus, as fotos de família. E resolveu que não mencionaria as roupas, os blusões de lã, casacões de inverno e sua carteira contendo alguma importância em dinheiro.
Preferiu ficar com os objetos conferidos a seus filhos em campeonatos esportivos, cujo valor estimativo justificava a desistência dos demais pertences.
Era possível que seu marido, ausente, tivesse saído 
para dividir os agasalhos com seus amigos de infortúnio. Os filhos, também ausentes, brincavam na vizinhança.
A dona da casa levou Lori para o interior da moradia e ela recolheu do chão os seus pertences, enquanto relembrava os bons momentos registrados junto aos filhos, ao ver as fotos que organizava  para guardar em sua bolsa.
E antes que alcançasse a porta avistou a dona da casa trazendo uma xícara de cafezinho para lhe oferecer.
Lori, para não parecer descortês, bebeu o café, com elegância, embora tivesse notado  as manchas escuras da xícara, de outros tantos cafés nela servidos. Acrescente-se a isso  o fato de que o café estava quase frio, com sabor de requentado, entre amargo e pastoso, como se o filtro estivesse corroído pelas traças.
Após beber o líquido colocou a xícara na pia e voltou para a sala, aguardando a dona da casa para se despedir.
Ficou observando o Rio Guaíba, através da janela, até ouvir os passos dela lhe perguntando :
- Mais um cafezinho ?
Subitamente se deu conta que não ficava bem recusar porque elogiara o primeiro. Mesmo assim, num impulso falou:
- Não, obrigada !
E ouviu: 
- Aceite, não me custa nada servi-la !
Paralisada, minha amiga Lori, olhou em direção ao bule que a dona da casa portava, quando lhe foi possível visualizar, aliviada, que esse, ao entornar, pingou apenas duas míseras gotas do liquido na xícara, inexpressivas e solitárias.

                               KATIA CHIAPPINI
                               E-mail: katia_fachinello42@hotmail.com



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