Aquarela de poesias

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Poesias para você

sexta-feira, 12 de julho de 2013

SAUDADES DO TREM MINUANO !

              MINHAS VIAGENS DE TREM !

Meus pais me permitiam visitar meus avós em Santana do Livramento, onde eu costumava passar minhas férias de inverno.
Desde cedo eu viajava sozinha de trem e me acomodava no vagão leito porque embarcava durante a noite.
Depois de alguns anos passei a viajar no trem comum onde permaneceria na poltrona durante toda a viagem.
Quando eu voltava de Livramento para Porto Alegre, minha vó tinha por hábito preparar um lanche suculento e se esmerava nessa tarefa.
Em certa ocasião recusei o lanche de vovó porque ficaria envergonhada, já adolescente, em abrir aquele farnel, como se ainda fosse uma criança faminta.
No dia da viagem, embarquei e segurei meu lugar junto à janela.
Do meu lado sentou um senhor não muito idoso e tranquilo.
Era um dia de frio intenso, em pleno mês de julho
Pensei estar bem agasalhada, mas logo me dei conta de que minhas roupas eram leves para segurar meu desconforto na poltrona.
Um vento frio começou a soprar em minhas pernas e pés e comecei a sentir o estômago vazio para completar o quadro.
Da janela do trem avistei extensões de campo e, as vezes, se avistavam alguns casebres, animais magros e gente descalça pela estrada.
Essa é uma visão comum na zona de fronteira onde as pedras e irregularidades do terreno não permitem que ali se plantem hortaliças ou árvores frutíferas. Assim, o homem do campo tira seu sustento exclusivamente da criação de gado.
Interrompi meus pensamentos ao ouvir o barulho de papel alumínio se abrindo ao meu lado. Tratava-se de um farnel do meu companheiro de viagem, que surgia aos meus olhos, descobrindo uma galinha com farofa, de aroma irresistível, o que prontamente atiçou meu paladar.
 O homem, gentilmente, se virou em minha direção e perguntou:
- Quer dividir comigo esse lanche, senhorita ?
- Vou aceitar, sim.
- Então, sirva-se à vontade e bom apetite.
E esperou que eu me servisse, o o que fiz, retirando as duas coxas da galinha, esquecendo a timidez.
O petisco estava saboroso, bem temperado, mastiguei, aos poucos, para aproveitar melhor o momento, sem pressa e me deliciando com a oportunidade de me alimentar.
Mas havia outro problema me preocupando : 
- Como fazer para não continuar sentindo frio ?
Abri o jornal após lanchar e desejei que a leitura me desviasse do desconforto e da sensação de frio que me tomava por inteiro. Li meu horóscopo e lá dizia que meu dia seria coroado de êxito.
Estava absorta lendo uma crônica, mas em dado momento olhei para o lado, por acaso,quando deparei com o homem dormindo profundamente, tendo nos seus joelhos um cobertor que parecia escorregar .Seguindo um impulso incontrolável, levantei com cuidado o cobertor e joguei sobre o meu corpo, prendendo bem as pontas em minhas costas. Sentindo-me confortável passei do sono ao sonho e perdi a noção do tempo. Depois ouvi um ruído do meu lado,  o que me despertou e me deixou em prontidão.
Agindo com presteza, procurei recolocar a coberta em meu companheiro que parecia se espreguiçar. Esse acordou a tempo de ver meu gesto, quando eu tentava devolver o que lhe pertencia. Com a pressa e o susto, derrubei o cobertor no chão ao tentar jogá-lo sobre seus joelhos.  Respirei fundo e, antecipando-me a sua provável voz de censura, fixei meus olhos nos seus e com um sorriso disse-lhe :
- Seu cobertor estava caindo porque o senhor se revirou durante o sono.
E continuei: 
- Estou tentando cobri-lo novamente e espero que, bem aquecido, possa recuperar seu sono interrompido.
- Obrigada, moça, quanta gentileza !
- Não me agradeça, o senhor, certamente, faria o mesmo por mim.
O homem não tardou a dormir e respirei aliviada e já aquecida.
Agora já se vislumbrava a cidade imponente com suas construções, fumaças, luzes , pontes e estradas.
Cheguei bem ao meu destino, não sem antes me despedir do meu companheiro de viagem , com um aperto de mão.
No trajeto da estação até minha casa pensei no prazer que teria ao saborear uma refeição feita por minha mãe, bem como na alegria de poder dormir em minha cama, quente e acolhedora, me esperando com lençóis limpos e perfumados.
Meu cobertor de lã de ovelha seria o complemento indispensável para que eu pudesse ter um sono reparador, na hora de descansar . 
E sonharia com o apito do trem Minuano, de minha infância e adolescência, e com aqueles meninos maltrapilhos que me abanavam sorridentes, pela estrada dos trilhos do trem. Esses também sonhavam em pegar o trem mas se contentavam em sorrir e sacudir os braços para quem passasse por eles.
Sempre gravei na memória esse sorriso infantil que me parecia tão esperançoso e singelo!

                                     KATIA CHIAPPINI


                                          EMAIL: katia_fachinello42 @hotmail.com


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