Aquarela de poesias

Aquarela de poesias
Poesias para você

quinta-feira, 8 de maio de 2014

DIA DAS MÃES: 11/5/ 2014.

               
                   SAUDADES DE MINHA MÃE!
                  Meus netinhos: Helena e Bruninho 


                            

    Dedico esse texto à mamãe e a todas as mães.                

Cuidei de mamãe por 6 anos e meio acometida do mal de Alzheimer, doença degenerativa que mata a função dos neurônios e debilita todo o organismo.
Nos últimos anos coloquei três atendentes para me auxiliar. Mesmo assim, eu dormia num colchão no chão, ao lado da cama dela. Ela se levantava para ir ao banheiro, para comer banana, para caminhar pela casa e para abrir e fechar gavetas na ânsia de verificar se nada faltava de seus pertences. A doença deixa a pessoa desconfiada, com mania de atribuir aos outros o pseudo sumiço de suas coisas. Também deixa nervosa, agressiva, com o humor oscilante e teimosa com relação aos hábitos de higiene.
Apesar desse quadro que eu vislumbrava, diariamente, procurei maneiras de tornar minha mãe mais feliz.
Aos domingos, pela manhã, tínhamos um encontro com Inezita Barroso e outro com Rolando Boldrin na televisão educativa.
Os violeiros interpretavam modas de viola do tempo em que morávamos em Andradina, Estado de São Paulo. E minha mãe parecia reconhecer algumas canções, porque me olhava e sorria.
Ao anoitecer eu levava mamãe para se sentar na garagem com a porta aberta para a rua, onde podia ver o desfile dos transeuntes.
Ela olhava para a lua e estrelas e apontava com o dedo para o céu.
Gostou muito desse breve programa e todas as noites, mesmo com chuva ou frio, eu a levava ´para olhar o horizonte.
Em outra ocasião minha neta levou o gatinho para que mamãe pudesse brincar com ele. Ela o colocou no colo e acariciou seu pelo.
Em dado momento o gato se desvencilhou, pulou do colo de mamãe.
Minha mãe, em sua juventude, era muito vaidosa e dedicava um tempo para costurar as próprias roupas que tinha orgulho de confeccionar. Então, nunca deixei faltar um serviço de manicure e pedicure à domicílio. E mantinha seu corte de cabelo e pintura.
Nessas ocasiões eu mostrava seu rosto no espelho e ela sorria e apontava para o cabelo bem penteado.
Mamãe passou os dois últimos anos perdida de si mesma, olhando para o vazio, sem poder falar e sem reconhecer ninguém. 
Foi passando pela bengala, andador e finalmente foi colocada na cadeira de rodas, ao perder a força nas pernas.
Mesmo assim, eu costumava sentar ao seu lado e contar fatos de sua infância na casa paterna, na esperança de que , em algum momento, ela se reconhecesse dentro dessa cena familiar, através de um breve sorriso ou de um olhar mais intenso. Mamãe tinha lindos olhos verdes e uma pele de seda e morena. Se não fosse essa sua doença implacável não mostraria a idade.
Outro modo de fazê-la sorrir era mostrar no computador as fotos da família que eu havia colocado em álbuns e armazenado. Apreciou uma foto minha de tela inteira que mostrei a ela. Ficou com o olhar espantado e me olhando como se perguntasse como eu fui parar ali.
Ela olhava a foto e acariciava meu rosto e sorria para mim: uma cena emocionante.
Mamãe costumava chamar pelo nome de sua irmã que mora em Santana do Livramento, na fronteira. Comentei com minha tia esse fato e ela passou a visitar minha mãe, aproximadamente, de três em três meses. Nessas ocasiões me telefonava, ao chegar, e eu levava salgadinhos e doces para tomar um chá com ela e com minha mãe.
Nos últimos anos mamãe também chamava por meu irmão e se queixava para mim da ausência dele. Mas isso não ocorria porque o mano a visitava todas as tardes. Só que a memória curta de mamãe não registrava mais nada e passados cinco minutos, se perguntassem a ela quem havia saído da casa, após a visita, ela dizia: 
-Não vi ninguém, estou sozinha.
Isso, quando ainda podia falar.
Ela me chamava e pedia para sentar ao seu lado e dizia: 
-Sabia, filha, o teu irmão já me esqueceu!
E eu falava:
-Não, mamãe, ele vem sempre na parte da tarde.
Em certa ocasião me disse:
- Minha filha, pegaram até o meu dinheiro, não sei onde foi parar.
E eu mostrava a ela o extrato bancário e explicava que o dinheiro estava aplicado e bem guardado no Banco do Brasil.
Tentava explicar que eu e meu irmão estávamos gerenciando sua conta e tínhamos o suficiente para pagar suas despesas.
Outra alegria que dei à mamãe foi a de levá-la para passar as tardes na praça central da praia de Torres, Rio Grande do Sul.
Lá se reuniam malabaristas, pintores de rua, músicos, dançarinos, mágicos e o pessoal da capoeira. E também os bolivianos com suas flautas típicas, músicas folclóricas e ainda um tocador de violino muito talentoso. 
Mamãe, eu e uma ajudante, ficávamos na pracinha das 15 horas até 19 horas. Ela olhava atentamente para os pássaros pendurados nos fios, para as crianças, para os cães puxados por seus donos e para todo o espetáculo que a praça deixava vislumbrar. Sentávamos embaixo da figueira centenária, protegidas por sua sombra.
Ainda em Torres, convidei uma amiga para cantar canções antigas, no dia de seu aniversário. Ela ficou feliz e quase saltava da cadeira se movimentando para melhor sentir a música. Então ouvimos valsas, boleros, tangos e um repertório sertanejo, tudo muito harmonioso, e que transformou nossa tarde numa bênção. 
Essas foram as pequenas alegrias que proporcionei a minha mãe.
 E ela, ao saber que eu iria tocar piano no restaurante do hotel Plaza São Rafael, ficou encantada, e a cada apresentação minha, mandava entregar um ramalhete com rosas que eram colocadas sobre o piano.
E isso foi um pouco antes de adoecer, mas uma das últimas lembranças que tenho da alegria de mamãe. Chegou a me assistir numa das apresentações e permaneceu atenta durante o tempo todo. 
Durante todo o período que cuidei dela, também levei flores para trocar no vaso que ficava em seus aposentos.
O trabalho físico que tive com mamãe e as noites, quase em claro, pelo período de dois anos, nunca me deixaram contrariada. Sempre soube que era minha obrigação e a cumpri com desvelo, sem nada reclamar.
Mas o que ficou marcado, e que guardo na lembrança, foram as horas em que a fiz sorrir, sua emoção ao apertar as minhas mãos com ternura, os gestos de carinho e seu olhar agradecido.
E estou lembrando, bem ao final dessas linhas, de que eu falava para minha mãe:
- Vou ficar esperando por você, quando se for, mamãe.
E minha mãe, ainda saudável me dizia:
- Por que isso agora, minha filha?
E eu lhe respondia prontamente e sem pestanejar;
- Se eu não for mais útil,volte de onde estiver e leve-me  com você.
        

                                       KATIA CHIAPPINI 


           

                                         E-MAIL:KATIA_FACHINELLO42@HOTMAIL.COM
             

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