Aquarela de poesias

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Poesias para você

segunda-feira, 7 de junho de 2021

AS AULAS DE PIANO

AS AULAS DE PIANO


ESTUDO DE PIANO NA MATURIDADE
Quero, com prazer, participar que tenho experiência com alunos de terceira idade, em relação às aulas de piano.
As damas chegam tímidas e já se desculpando de não saber ler partitura, de não ter estudado antes.
Contam que já quiseram estudar mas os rumos de suas vidas as afastaram desse sonho.
Mas, ao iniciar o estudo, já se percebe um sorriso luminoso, uma fisionomia tranquila, uma energia que transparece nos movimentos do corpo.
E. após algumas aulas, elas já chegam um pouco antes do horário e não se importam de aguardar o término da aula anterior.
Sentam na banqueta, junto ao piano, e me olham aguardando as instruções do dia.
E, ao dedilhar as escalas iniciais, mantém a concentração necessária e se esmeram em apresentar bons resultados.
Os dedos nervosos buscam sons e tons, arpejos e acordes, tentando observar a exatidão do ritmo e da contagem dos tempos.
Quando chegamos na primeira valsinha, a primeira melodia , após exercícios diversos, o sorriso vem chegando e se transforma em euforia e uma gargalhada veste o ambiente, e, não raro, a cantoria acompanha o toque.
As exclamações surgem e o entusiasmo é notório.
Quando a aluna já toca com desembaraço a valsinha, eu faço um acompanhamento, ao piano ,e as mãos agora são em número de quatro; as famosas quatro mãos na mesma melodia.
Uma senhora de 84 anos, a aluna mais idosa, conseguiu tocar as canções que acompanharam sua infância .E quando fazia seus estudos, em casa, o marido se aproximava para escutar.
E minha aluna especial percebia, sem que olhasse para trás, que o jornal era fechado e o arrastar da cadeira vinha se aproximando.
Quando nos reuníamos para o encerramento do ano letivo, essa aluna era a mais faceira e ficava destacando o fato de que o piano havia mudado sua vida e afastado até seus problemas de artrite nas mãos.
Outras alunas perceberam que a memória era ativada, que a concentração voltava, que os reflexos das aulas traziam à tona uma leveza para enfrentar um dia de atividades.
Percebiam que voltavam a se reunir com as amigas e que aceitavam o convite para tocar em reuniões informais.
A sociabilidade e o bem-estar são parte dessa harmonia que equilibra as emoções, que dá sentido à vida.
Uma de minhas alunas, num desses encontros, disse:
- Para mim, cada aula é um espetáculo.
Outra completou:
- Estou realizando um desejo de infância e juventude.
Outra aluna assim se expressou;
- Muito obrigada, professora, por me deixar tocar só com a mão direita, para eu perceber a melodia. Porque a mão esquerda é muito exigente...
Um certo dia, outra aluna trouxe a flauta doce para me acompanhar ao piano e ficou emocionada com o resultado dessa façanha.
Sempre é tempo de recuperar um sonho. E tocar piano é um lindo sonho que pode se tornar real com muito empenho e disciplina.
Ninguém disse que é fácil!
Mas, sabemos que quanto maior for o empenho maior será o resultado e a satisfação .
O principal objetivo do estudo de piano, na terceira idade, é possibilitar uma percepção da vida com um sentimento de autoestima, uma afirmação de capacidade e a obtenção de bons resultados. principalmente, para a saúde emocional.
Além disso, conviver com arte é cultura, é propiciar envolvimento e interação social, é lenitivo e bálsamo.
Dificilmente as minhas alunas de terceira idade faltam às aulas.
E, se isso ocorre, já me solicitam um horário para recuperação.
Tenho prazer em tornar ágeis, esses dedos já mais grossos, com menor mobilidade, mas preciosos quando dedilham canções e baladas românticas.
Em certa ocasião, quando toquei numa de nossas reuniões, ao terminar a primeira peça, olhei para trás e percebi algumas lágrimas manchando a maquiagem das damas.
Outras, não contiveram seu impulso. E vieram me abraçar, agradecendo ter interpretado um bolero do tempo em que namoraram seus atuais companheiros de décadas, ao mesmo tempo, que se reportavam aos bailes em luxuosos e iluminados salões.
O trabalho requer uma preparação cuidadosa. Precisamos escolher as peças adequadas a cada adiantamento, escrever partituras facilitadas, adequar o ritmo e atender, minimamente, às preferências musicais de cada aluna.
Preciso escutar as versões feitas e buscar a que mais se aproxima do desejo da aluna.
Mas, isso tudo é um prazer que se multiplica a cada toque que percebo mais firme e cuja evolução se faz sentir, na continuidade das aulas dadas.
As damas me falam de suas dificuldades do dia a dia, de suas preocupações com os filhos, com as precariedades e necessidades recorrentes.
Pode parecer'' fofoca'' de um salão de beleza, mas, é simplesmente, um desabrochar de emoções, um fortalecimento de amizades, num ambiente sonoro e envolvente.
Que me confirmem os músicos eruditos que se tornam nossos irmãos, pela proximidade musical e espiritual.
Bach nos envolve com sons medievais e litúrgicos ,tornando-se um virtuose com sua composição 'Toccata e Fuga,'' Mozart nos apresenta a'' Alla Turca'', Chopin, os seus prelúdios e valsas de beleza inigualável. Strauss e orquestra nos inebriam com as valsas vienenses, Beethoven com'' Für Elise'', Vivaldi com'' As Quatro Estações''.
Minhas especiais e queridas alunas prestigiam esses compositores quando dedilham as melodias de tal porte.
Cada toque que percebo, de cada uma das alunas que me dão o privilégio da convivência, se projeta na pequena sala de música.
Mas mesmo que o espaço fosse amplo, não seria suficiente para conter tantos sentimentos.
O som do piano escapa pelos corredores do edifício, se transforma em encantamento, vai ecoando e emocionando.
E os anjos e arcanjos, alvos e esvoaçantes, dançam no espaço celestial.
KATIA CHIAPPINI
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