Aquarela de poesias

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Poesias para você

sexta-feira, 24 de outubro de 2014

O CAPATAZ

                                  
                         O CAPATAZ DE ESTÂNCIA!
                                  

À galope pelos campos lá vai o capataz percorrendo os potreiros.
O cachorro fiel vai ao lado do cavalo e acompanha o capataz em todo o trajeto. É,geralmente, um guaipeca. Ao final da tarde regressa ao ninho para o devido descanso da lida do campo.  Esse gaúcho é um homem bronzeado, com pua de aço, correndo à cavalo. dispersando sonhos e, como a águia, singrando horizontes.
O capataz não abandona a querência.
Seu João, capataz de meu tio, está com 65 anos ou mais, 40 dos quais, no trabalho da estância São Miguel do Sarandi, em Livramento, fronteira com o Uruguai. Lá criou sua família, recebeu terra e gado, como estímulo, para seu sustento.Tem uma vaca de leite, uma pequena horta e detém a confiança do patrão.
É ele o responsável por manter a peonada ativa em seus afazeres e pelo cumprimento das tarefas diárias, já estabelecidas.
Ao final da tarde o capataz se dirige ao escritório de meu tio e presta conta da lida. Sugere novas providências, lembra das compras a serem feitas na cidade e dirime dúvidas.
Muitos fatos curiosos presenciou na estância e vou relatar um deles:
-Como não lembrar?
Certo dia um moço da cidade chegou para se hospedar na estância.
Levava um revólver  que não parecia combinar com o traje social que vestia. Recolheu-se aos seus aposentos, levantou cedo e disse que ia caçar perdiz.
João, o capataz, perguntou-lhe:
-Mas o moço tem certeza de que vai caçar de revólver?
-Sim e já estou de saída.
E João, surpreso, foi comentar com todos os demais o ocorrido. Isso porque nunca tinha visto ninguém trocar a espingarda de caça por um revólver.
Ao entardecer voltou o moço sem nenhuma caça e percebeu que a peonada o aguardava curiosa. E os cochichos se multiplicaram por todos os pagos.
Quando a noite ia chegando, os peões se reuniam para tomar chimarrão, assar uma carne no fogo de chão, contar ''causos'' e lendas. E ouvir o som do acordeon interpretando alguma milonga, rancheira ou chamamé.
Aos domingos o churrasco era acompanhado por refrigerantes e o vinho fazia parte do lazer do homem do campo.
Era possível assistir às corridas de cavalo, às lutas de galo de rinha e apostar uns trocados para tentar a sorte. O boliche também era uma diversão muito apreciada e cultivada nesses pagos.. Ainda havia os rodeios que faziam a festa do gaúcho.
Não há rincão suficientemente agreste que impeça o capataz de trabalhar. Ao contrário, sua lida é seu lazer. E seu rancho é sua vida. Ele só se sente bem em meio à natureza e junto ao gado.
O capataz atravessa campos, vales, açudes, rios e cachoeiras. E se deixa envolver pela beleza da paisagem. Percorre caminhos com pedras, aprecia as árvores frondosas, ranchos à beira da estrada e uma imensidão de campo a perder de vista.
Vive cercado por ovelhas, cavalos, bois, touros, vacas, porcos, galinhas, avestruzes, garças, cães e raposas. E as cobras do campo, não raro, aparecem perto de seus pés.
O tempo passa e chega a hora dos filhos do capataz irem estudar na cidade. E mesmo vendo sua prole tomar outro rumo, ele faz questão de permanecer nos pagos. É que sua alma já fez o pouso predileto e não vai alçar voo para outras cercanias.
Tocando a carreta, o jipe de serviço, o caminhão ou o seu cavalo, de coxilha em coxilha e de rincão em rincão, o capataz divulga os usos e costumes do gaúcho.
Com pilchas e bombachas enfeitadas com favo de mel nas laterais, com o seu facão na cintura, com botas de cano alto, chapéu e lenço, vai o capataz marcando os passos da história com requintes de glória. Vai ensinando o que representa a tradição do gaúcho por essas terras distantes e estradas sem calçamento.
O capataz sempre vai se lembrar da confusão em torno dos rodeios, da sombra das árvores, do alarido na porteira dos currais. Nem da época de tosa, vacinação e marcação do gado. E da pujança da dança do facão e da dança do pau de fita, respectivamente, dançadas pelos homens e pelas mulheres. 
O capataz sempre vai ter na memória a beleza da prenda com seu vestido rodado e uma rosa vermelha nos cabelos. E nem lhe é possível esquecer de seu andar à cavalo e dos cabelos soltos ao vento, balançando e fazendo ondas ao galopar pelos campos sem fim.
O capataz é sentinela das estâncias, amante das tradições e a figura altiva que melhor representa a lida no campo e o amor aos pagos dessa querência.

                                     KATIA CHIAPPINI

      

                          e-mail:katia_fachinello42@hotmail.com

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