Aquarela de poesias

Aquarela de poesias
Poesias para você

sábado, 17 de abril de 2021

REFLEXÃO: INDEFINIÇÃO

REFLEXÃO: INDEFINIÇÃO


 INDEFINIÇÃO: REFLEXÃO

INDEFINIÇÃO
Pareço desintegrar .Acordei com uma sensação de que o
corpo não responde mais a nenhuma emoção e que está perdendo a vitalidade rapidamente.
Vislumbro uma suposta calma em meu ser. A natureza está em seu lugar mas não consigo perceber mais as paisagens como um todo harmônico, só vejo pontos esparsos e desconexos. Aquela árvore altaneira e embaixo dela , aquele banco de praça, se tornaram estranhos para mim. Não sinto o ar em meu rosto, nem as flores das árvores penteando meus cabelos, nem o aroma da estação tão ensolarada e fértil, alimentando todos os seres e acendendo as paixões latentes. Não lembro do andar das pombas, procurando restos de pipoca , junto ao carrinho do pipoqueiro. E o mar de meu verão? Se tornou tão barulhento, quase irritante. Será o mesmo mar que amo tanto desde a minha infância? E as pessoas na rua? Sempre apressadas, de cara fechada, tão egoístas? E o horizonte? Faz um tempo que não procuro nele um bando de andorinhas cortando a imensidão azul. E o cão de minha rua? Sem dono e sempre presente entre os canteiros? E o lavador de carros e o papeleiro? Também se ausentaram de meu bairro? E meus amigos? Todos se encontram de férias. Não os tenho encontrado .
Por que a terra me parece tão árida? Ou será que meu campo de visão se modificou a ponto de só me permitir ver distorções no planeta?
O que consigo lembrar é de um fato que está nas minhas dúvidas existenciais e que talvez responda a essas indagações
Vou tentar expor os fatos:
Há um ano atrás conheci um internauta e passamos a conversar , sempre a mesma hora ,durante a noite.
A comunicação se tornou importante para nós e o que parecia uma brincadeira foi se modificando e se tornando gratificante, repleta de surpresas. Vieram à tona os sentimentos mais íntimos, como consequência das demonstrações de afeto , compreensão, companheirismo e de raros momentos de confidências e de mútuo conforto.
E o envolvimento foi chegando de mansinho, sereno, insinuando-se nas entrelinhas do teclado que não teve mais trégua, sendo dedilhado, noite após noite, freneticamente. Quando havia algum desentendimento se delineando, as letras eram escritas sem espaço, sem pontuação e havia troca de palavras, naquela necessidade de esclarecer devidamente, algum mal -entendido, por conta de errôneas interpretações. Mas esse toque foi muito além dos dedos deslizando nas teclas. Invadiu o coração de dois seres ávidos por compartilhar bem mais: uma vida nova e não menos fascinante.
As noites se sucediam e os assuntos também: música, filmes, esportes, literatura, hábitos pessoais, profissionais e assuntos de família. E durante 365 dias, os teclados, adquiriram um ritmo próprio e colocavam palavras na tela que eram absorvidas atenta e intensamente. E a internet, intermediando essas vibrações e sua única testemunha, passou a ser o veículo mais requisitado para dar sentido a melhor hora do dia: era a da energia que se renovava para tornar mais leve o fardo do dia seguinte.
Não foi feita a troca de fotos, nem de telefone, nem havia outra forma de correspondência. Só o teclado era o palco das vibrações e o ponto de união.
Mas a certa altura meu internauta não insinuava outros modos de proceder ,além da presença aqui.
Sugeri um encontro por julgar ser esse o procedimento normal, após um ano aqui no teclado, demonstrando a dedicação
de ambas as partes. Estava curiosa para sentir o calor de um aperto de mão, o olhar profundo no meu olhar, o apelo .
Queria caminhar ao longo do mar, apreciar a natureza e todos os seus ruídos. E seja qual for o rumo a se delinear, não consigo, nem com a tranquilidade que me é peculiar, não mais entendo a permanência da distância, durante um segundo ano, através da internet. Mas entendo perfeitamente que pode haver, por parte do internauta, o medo de se revelar para mim. E depois do primeiro encontro, os fatos tomarem um rumo diverso do esperado. Isso causaria decepção e sofrimento.
E se perderia também o que se construiu até agora: o contato virtual diário. Mas o risco cabe a ambas as partes, não se ´pode prever o resultado. E não vejo outro modo de agir sem que se tenha que pagar esse preço.
Mas quem não arrisca foge da vida e sufoca os próprios anseios. E em meio às lutas diárias nas quais o homem se vê envolvido, temos que pensar num encontro com nosso interior e na busca de outra alma que nos complete, para sermos mais um par privilegiado, inserido entre outros tantos, motivo de prosa e verso, de incansáveis poetas.
Não somos ilhas e nem nascemos para o isolamento. E não entenderia se me dissessem, que ao invés de buscar o conforto espiritual junto ao ser amado, tivéssemos que nos esconder numa pequena estrela, já sem brilho, ou permanecer nas sombras de uma noite sem lua.
Estaríamos aceitando ser, e com nossa própria permissão, alienígenas de nós mesmos.
E como esquecer do brilho do sol que vem nos aquecer todas as manhãs?
A indecisão magoa muito mais do que a revelação da verdade. Só a indecisão é responsável pelos fracassos e justifica o retrocesso da humanidade.
A indecisão gera a indefinição e, mais que isso, submerge os sentimentos profundos e obstrui a arte do encontro. Ela nos dá uma sensação de impotência e de menos valia.
Quando alguém que amamos nos antecipa a possibilidade da presença, se torna inadmissível suportar a ausência.
Em segundos todas as coisas que antes brilhavam a nossa volta se tornam opacas e desprovidas de encanto.
Em solidão e no silêncio, vamos vivendo pela metade, sendo jogados às intempéries e tomados pelo desamor que passa a preencher o lugar que estamos guardando para abrigar a prometida e avassaladora paixão. Pena que não é eterna.
Em verdade, como podemos intuir, eterna é a busca do homem pelo seu universo interior, pela complexidade da descoberta de sua essência.
Eterna é a preocupação do homem com suas origens, seu lugar nesse plano, seu objetivo e finalidade.
Eterna é a insatisfação que nos assola na medida que nos revelamos seres imperfeitos, egocêntricos e a cada século evoluindo tão pouco em matéria de sentimentos, a ponto de não descobrir a força do amor como única energia e cujo campo magnético, procura o íman da felicidade para a ele se unir.
E a tão citada felicidade, apesar de ser uma nuvem passageira, é a única que importa aprisionar e que por isso ,justifica nosso empenho, para estarmos inseridos entre os que conseguiram obtê-la.
Só que para ser feliz há um limite que não podemos ultrapassar, sob pena de bloquear nosso caminho.
Fico me perguntando se vale a pena sofrer tanto, se temos em nossas mãos a possibilidade de sermos felizes.
E entre tantas indagações me pergunto se vale a pena chegar ao fim da vida sozinho mesmo tendo consciência de que a pessoa amada existe e espera.
E insisto em outra indagação:
-Vale a pena desprezar a pessoa amada? A que abre a porta de sua casa e olha ao longe como se o vulto amado pudesse surgir ? A que espia pela janela da alma mas que sente a exaltação do corpo? A que sonha ter tocado seu amor, mas que se surpreende quando acorda sozinha?
Se for assim, realmente o amor se perdeu na imensidão da galáxia, foi superado pelos inventos científicos e tecnológicos e só eu não percebi ,que ele há muito se fragmentou, como se fora um meteorito a se esfacelar em algum canto do cosmos ,para ser mais uma , entre tantas ilusões perdidas. Ou voltou a se esconder no núcleo de um átomo, invisível a olho nu.
E por falar em nudez, a nossa, a de dois corpos apaixonados, a caminho da explosão, se não lembrarmos da senha , não se revelará jamais.
katia/
Pode ser uma imagem de rosa e texto
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